30.12.09
remorse code. parte maldita, o amor dela cheira a terebintina e ela não gosta, mas queria gostar, sente que devia gostar, ou, pelo menos, gostava de não sentir-se incomodada com o cheiro.
23.12.09
o amor em tempos de pressa. isto é um caso de fim e limite, um assunto de coito, não de antes. ele tentou-lhe uma carícia, algo que a dispersasse e o isentasse, mas ela evitou-o e, para ti, rapidinha e ejaculação precoce são uma e a mesma coisa, manteve o tom severo e a recriminação, porém não são. continuou assertiva, e não, não, isto não é uma observação sobre o limite de conceitos, sobre definiens e definiendum, é uma observação de medida, mais exactamente de dromologia. ele corou e, mas, Maria, eu sou deus, não sou o senhor de todos os hidráulicos, balbuciou uma alegação. ela permaneceu irredutível, até podes ser o Alfredo marceneiro ou o menino Jesus, não interessa. há coisas que são para demorar. não gosto de acelerados e celerados, o que é que queres que te faça?, não me convêm. cabisbaixo, sem defesa, eu não sou escrava da velocidade, não sou dromocrata. por isso, ele ouviu a sentença, comigo, aguentas, firme e sem pressa, ou escusas de vir.
16.12.09
cerca de meia hora, iii. no escritório. está on, está a gravar. ela e ele arrumaram-se na cena, em posições diante da câmara. eu acho que temos de morrer, ela começou assim a declaração. agora?, ele inquietou-se, não nos podemos precipitar, a morte tem hora certa. ela insistiu, temos de morrer, ser breves na morte, só isso. ele preparou primeiro o corpo, preparou depois o agrafador. ficaram quietos e calados durante seis minutos. acho que já está na hora, na hora da nossa morte, estimou ela, cortando o silêncio. ele testou-a, tens a certeza?, e olhou para o relógio. ela confirmou, tenho, ao mesmo tempo que inclinou a cabeça para diante, até encontrar a fronte com a secretária. ele matou-a, não tanto com os agrafos vinte e quatro seis, normais, que mal penetraram no escalpe dela, quanto com a contundência das pancadas que desferiu. depois, constatando-a inanimada, recusou suicidar-se. virou-se para a câmara, procurou a hipótese de um grande plano e, já estás, disse, já está.
2.12.09
cerca de meia hora, ii. ele tinha a face assente no peito dela, aconchegou a cabeça aí. ela acudiu-o, ao mesmo tempo passou os dedos pelo cabelo dele e disse sinto chover no meu coração. ele procurou outra posição para a cabeça mas acabou por arrumá-la onde estava, estendeu um braço até a um ombro dela para a confortar e confortar-se, e discordou, isso não é possível, eu não estou a chorar. não estarás com azia?
2004/2022 - O Marquês (danado por © sérgio faria).