13.3.07
num quarto escuro do warren milks hotel. para desligar o surround de demónios que lhe aflige a cabeça, um dia suicidar-se-á. invocará a necessidade de libertar-se da vida e de sentar-se sobre a sua fortuna. invocará a necessidade de não tornar a olhar para trás. sente que os espelhos lhe traem a beleza. já tentou fechar os olhos, mas não surtiu efeito. os reflexos persistiram na sua memória, consolidando-lhe a sensação de os retrovisores não serem justos. portanto, um dia suicidar-se-á. no entanto, a perseguição da decadência não terminará com o suicídio. após a sua morte, os bichos comer-lhe-ão a carne.
12.3.07
crónica de uma vida et cætera, iii. deus disse, falar de amor é estranho. escrever sobre amor, como tu fazes, é ainda mais estranho. porque, presume-se, o amor é uma torrente não verbal, mais do que dispensa palavras. ela olhou-o. depois desviou o olhar, como se o ignorasse. deus insistiu, o amor é um fruto, como a nêspera, percebes? eu comi esse fruto e, por isso, agora, amo-te. ao mesmo tempo estendeu uma mão, tentando alcançá-la. ela tornou a mordê-lo.
10.3.07
crónica de uma vida et cætera, ii. ela disse, sabes?, os olhos marcam o engano. o movimento delicado, o deslize suave, a escusa encenada, todas estas manobras não iludem a mentira. olhos nos olhos, ela aí está, demasiado presente, a mostrar-se. um segredo, a mesma traição. uma necessidade não avisada, o mesmo erro. não falha a emoção. também não falha a omissão, o engano. que fazer?, esta é a pergunta que não te coloco, que não posso colocar-te, porque não é possível exigir-te lealdade. ninguém nasceu para ser leal. para além disso, sabes?, olhos nos olhos, não enganas, enganas-te. a perfídia é a consequência desse facto. e não são as lágrimas, as tuas ou as minhas, que a lavam.
9.3.07
como o outro. deixai vir a mim as criancinhas, também disse o senhor de montmorency-laval.
6.3.07
crónica de uma vida et cætera, i. deus disse-lhe, vou ser sincero contigo, de mim não esperes lealdade. ela replicou, de ti não espero lealdade, também não a quero, basta-me a tua carne. por instantes foi o silêncio. deus aproximou-se. ela mordeu-o.
5.3.07
carver contra carver. a necessidade de sangue consome e processa quem a padece. o que faz da vida um jogo a perder pelos outros. quando não faz, melhor seria que fizesse.
2004/2022 - O Marquês (danado por © sérgio faria).