1.4.09
estrada nacional cento e vinte e dois. estacionei o carro na berma da estrada, carro que foi muitas vezes o altar da nossa paixão e da sua consumação. mudei-me para o banco de trás, para ficar ao teu lado. despertei-te, sacudindo-te o corpo. era já manhã. outros veículos, ligeiros e pesados, circulavam a velocidade alta e faziam-nos estremecer. tu mal acordada, quase despida, eu diante de ti. fiz-te a pergunta porquê? sem querer, menos ainda desejar, a resposta. eu já sabia porquê, não necessitava da tua confirmação. eu tinha visto tudo, eu tinha-te visto. porquê? serviu de pretexto. na verdade, quanto fiz a pergunta já sentia a cartilagem da tua traqueia a falir sob a pressão dos meus polegares. sabia que, como a culpa, a resposta não podia sair de ti. mas, mesmo assim, algo em mim sentiu necessidade de a exigir. as palavras costumavam aproximar-nos, fazer-nos íntimos. talvez tenha sido isto que me fez perguntar-te porquê?, a pergunta simultaneamente da acusação e da sentença.
2004/2022 - O Marquês (danado por © sérgio faria).