3.10.07
suite. a besta que te fareja a ferida e persegue, atraída pela seiva doce e cálida vertida da tua carne, já trepa a escada. como se fosse um fantasma, sem perturbar a quietação do hotel, sobe e aproxima-se da porta do quarto onde tentas o bálsamo para o golpe que levaste. sangras e o perfume do sangue é-lhe um apelo demasiado forte. nada a deterá. ainda assim, para evitar denunciar-se, a besta modera a respiração, abafa-a tanto quanto pode. é grande a necessidade de não comprometer-se. ela sente-a. calcula o avanço, de modo a que o ataque que prepara seja sem aviso. há uma honestidade estranha no seu movimento. a porta está fechada, o avanço é lento. esta é a tua última oportunidade. depois, porque prevalece a aristocracia das espécies, serás sem amparo. verás tarde demais o assalto, apenas quando já sem hipótese de esquiva ou evasão. ouvirás a respiração que se precipita sobre o teu pescoço, sem tempo para gritares. o teu sangue chama-a.
2004/2022 - O Marquês (danado por © sérgio faria).