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atelier de domesticação de demónios

caderno de variações sobre dores em dó menor, por O Marquês. 

28.9.07


psychic hearts. vamos jogar à batalha naval. desenharei as quadrículas no teu corpo e marcarei aí os tiros com alfinetes com cabeça colorida. a azul, os tiros na água. a preto, os tiros em qualquer barco. a vermelho, os tiros no coração, o teu.

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27.9.07


pagan angel and a borrowed car. a morte que se celebra nos funerais não é a morte de quem morreu, mas a morte de quem ficou ainda. já alguma vez visitaste um depósito de ferro-velho? de sentido a sentido, as condolências são a transmissão de um voto de vida entre quem ficou ainda. ouviste os vagidos da sucata?, dos carros mortos? mesmo assim, as vésperas deixam de ser toleráveis como foram antes. consegues andar?, ainda consegues andar? ou desistes? porque amanhã continuará a haver a falta de alguém ou algo que falta já hoje. acorda, agora acorda. amanhã, como hoje, a mesma ferida, até ser cicatriz que nunca será.

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25.9.07


aquilo atrás da máquina de flippers, iii. antes de Guadalupe Müller começar a falar, há em ti um problema de medida, que é o mesmo que dizer um problema de gravidade, ninguém tinha reparado nela. aliás, agora, ali, parecia uma personagem deslocada. falava sobre o perigo que as máquinas constituíam, todas as máquinas, com ênfase de pregador. quando digo todas as máquinas, digo as máquinas de flippers inclusive e apontou uma dona elvira, a relíquia da casa. muitas mãos acariciaram aquela máquina, suaram sobre os seus cantos. muitas mãos de muita gente bateram-lhe, aprendendo a explorar a folga do tilt. desde sempre houve sobre o seu quadro uma placa com uma inscrição misteriosa, es muß ein mensch an der maschine sein!, que ninguém conseguiu decifrar, mas que a não poucos fez recordar a placa posta acima da cabeça do mais célebre dos crucificados. nunca a alguém aquela máquina pareceu perigosa. pelo contrário, por ser uma máquina com poucos melindres, à antiga, todos os dias conseguia atrair clientes. porém Guadalupe Müller acusava-a com a mesma inclemência com que acusava todas as outras máquinas. alguém sabe o que está atrás daquilo? e continuou a apontar a dona elvira, mais precisamente a parede a que a máquina estava encostada, como se apontasse um poço de horrores.

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18.9.07


uma mão sobre Pavese. dirigiu a mão trémula, a mão direita, à garrafa de bourbon. pareceu avocá-la com o gesto. como permaneceu distante, foi obrigado a concertar-se na cadeira para poder alcançar a garrafa. agarrou-a, encontrou-a com a boca, bebeu dois tragos longos. devolveu a garrafa à mesa com estrondo e deixou a mão abandonada sobre aquele corpo de vidro, como se o segurasse. desde o acidente, estas crises eram recorrentes. aquela casa e, dentro da casa, aquela sala transformaram-se no domínio da sua evasão. a garrafa era a lâmpada da expiação. prova-se a liberdade e produz-se um efeito de dependência somática. não é pelo espírito que se deseja a liberdade ou se necessita dela. na origem o corpo resiste, porque com a liberdade vem o incerto e o corpo não é atreito a plataformas sem densidade, como o ar ou a água. neste sentido, no princípio talvez seja o espírito que depoleta a curiosidade, inclinando à liberdade. mas depois, ainda que pelo espírito possa justificar-se tais desejo ou necessidade, como continuidade a liberdade é uma exigência própria do corpo. repetiu o acto, bebeu mais dois tragos longos de bourbon. sentiu um ardor instalar-se no corpo, primeiro descendo até um ponto alinhado com o umbigo, depois estendendo-se por toda a carne. desta vez largou a garrafa. depois procurou uma página específica de lavorare stanca. para além da garrafa de bourbon, o livro era o único objecto sobre a mesa. uma chispa de sol, ténue, embateu no soalho, junto aos seus pés, interceptada e reflectida por uma janela que o vento empurrara para dentro. pousou o livro sem conseguir encontrar o poema que procurava. bateu com clamor na sua capa, duas, três vezes. alguém rasgara algumas páginas, levando o deus-cabrão. filhos de uma puta, cambada de filhos de uma puta. comportava-se como um animal instintivamente disposto a defender a integridade do seu reduto, a começar pelo corpo. perseguiram-me, matei-os. desmanchei os seus cadáveres. agora os chacais têm repasto. sou livre. havia tempo que, por suspeita, tentavam capturá-lo e submetê-lo a um teste de culpa. várias brigadas foram envolvidas na perseguição, missão que se revelou mais difícil do que inicialmente estimado. outros mais que venham ao meu encalce encontrarão destino semelhante. os chacais continuam com fome. com consciência da respectiva inocência, porém acossado, sentia que, através da culpa que lhe atribuíam por suposto, estavam a roubar-lhe o corpo, fazendo de si um fantasma. por isso não admitia a hipótese de submeter-se a julgamento. conforme entendia, a assunção de tal hipótese implicava tolerar um cargo de culpa virtual que não tinha. ele estava decidido, jamais entregaria o corpo. outros mais que venham ao meu encalce aprenderão o que é a defesa de um homem livre, o seu corpo, as suas mãos, a sua faca. e continuou a esperar que chegassem.

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14.9.07


o admirável mundo das ferramentas. sem aviso, ela foi visitá-lo ao local de trabalho. queria trocar mimos, atenção, namorar, gostas de bacalhau com natas?, saber o que ele queria jantar. no entanto ele não conseguiu corresponder à expectativa que ela tinha penhorado ao decidir ir ali. demasiado ensimesmado e tímido, surpreendido pela presença dela, o mais que conseguiu fazer foi convidá-la a passear pela loja, oferecendo-se como cicerone. com isto, esquivando-se às manobras de afecto, beijos, abraços, afagos, carícias, toques, olhares, ele entreteve-se a apresentar-lhe a panóplia de ferramentas existente no estabelecimento. isto é um apalpa-folgas, disse, apontando uma bolsa pequena do mostruário. ela soltou um risinho de escárnio. tal facto não o inibiu. pelo contrário, tonificou-lhe a vontade de a impressionar. por isso, seguro e com um entusiasmo raro, prosseguiu a visita guiada, isto é um roquete para chaves de caixa com encavador de meia polegada, isto é um jogo de chaves para parafusos com cabeça com sextavado interior, ora pegando as ferramentas cujo nome enunciava, ora apontando-as nos expositores. Isto é uma chave inglesa, isto é um alicate de pressão, este aqui é um alicate para freios, para abrir, este outro também aqui, sem mola, é igualmente um alicate para freios, mas para fechar, isto é um alicate de corte, isto, isto, isto, isto... ele continuou o apontamento entediante, grato para ele apenas, enquanto ela desviou a sua curiosidade para o expositor das ferramentas de impacto e percussão. havia aí martelos, maços e malhos de tipos e tamanhos vários. à frente deste expositor, no chão, estavam três bigornas, com dimensões distintas, alinhadas em crescendo, da esquerda para a direita. indiferente ao desvio dela, concentrado na missão a que se entregara, isto, isto, isto aqui, este, isto, este, aquilo, isto, isto, olha, isto, isto..., ele prolongou a arenga, como se fosse um botânico a apontar toda e qualquer planta, ao mesmo tempo que pronuncia o respectivo nome científico. pouco depois soou a sirene de uma ambulância. parou junto ao estabelecimento e os bombeiros recolheram um corpo, que deitaram na maca. a rua ficou sob um aparato incomum, muita gente, consternação, agentes da polícia. ele, rapaz tão novo, estava morto. o relatório da autópsia definiu como causa da morte a contusão cerebral resultante do politraumatismo craniano produzido pelo uso repetidas vezes de um objecto contundente.

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12.9.07


culpa, uma categoria ideológica. a verdade é que a culpa é necessária. sem culpa atribuída não é possível a redenção. mas a redenção que importa não é a de quem a quem foi atribuída a culpa. alguém com culpa é alguém com culpa e deve sofrer em conformidade. deve suportar a reparação da grei e do espírito que lhe corresponde, deve expiar o seu erro, a expensas suas e do seu corpo. por isso, através da atribuição da culpa, mediante a cobrança social do erro, a redenção que releva é a redenção dos outros, a comunidade. alguém deve ser apontado, há quem deva sofrer, para que os outros possam celebrar a normalidade e, na sua ilusão, lograr e confirmar a própria desculpa. sem isso não é possível a conciliação entre culpados e desculpados, não é possível a comunidade. foi com estas palavras que Thomas Holtz encerrou a sua conferência. depois perscrutou o auditório e, focando o olhar sobre a fila dianteira, perguntou quem foi?, acrescentando o aviso há um castigo para aplicar. ninguém respondeu ou correspondeu. quando não é possível apurar e atribuir a culpa a alguém, sofrem e sofrerão todos.

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2004/2022 - O Marquês (danado por © sérgio faria).