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atelier de domesticação de demónios

caderno de variações sobre dores em dó menor, por O Marquês. 

14.6.07


a biografia. o contrato cessaria após as exéquias do biografado. pelo que, enquanto ele vivesse, ela, a biógrafa, deveria acompanhá-lo em todas as circunstâncias, as públicas, as privadas e as íntimas, sem que, em qualquer momento, qualquer que fosse, ela pudesse ter intervenção sobre os acontecimentos que testemunhasse. grosso modo, era-lhe exigida atenção, apenas e só. deveria estar tão próxima quanto obrigasse a verificação dos actos, das palavras e dos diálogos do biografado. porém também deveria estar tão distante quanto obrigasse a reserva de tais actos, palavras ou diálogos. o que significa que, quanto ao mais, ela deveria guardar-se silenciosa e invísivel, para evitar qualquer interferência na vida do biografado. no início, embora inusitada, a missão pareceu-lhe interessante. tanto que dedicou-se afincadamente, estenografando tudo o que, pelos olhos e ouvidos, testemunhou, episódios edificantes ou decandentes. uma noite, imaginou-se deus. parecia uma carcaça imponente, asada, mas incapaz de alar-se. como deus, não obstante omnívoro, revelou-se cioso da sua dieta de carne. a sua imponência crescia-lhe e saia-lhe daí, não do espírito. naquela circunstância, imaginou-se deus com uma dignidade medieval, nobiliárquica, num banquete permanente, afundado entre as vianda que iam colocando sobre a mesa. ao seu lado e alcance, um cálice sempre cheio, do qual ia bebendo o melhor néctar e com o qual também embriagou as visitas, três jovens belas, com carnes soberbas e firmes, capazes de, pela exposição apenas, amotinarem o corpo de qualquer macho que as visse, mais ainda as três, se juntas. chegou inclusivamente a vigiar o sono do biografado ao longo de vários anos, para poder reportar o modo como ele dormia. não obstante a sua dedicação quanto a este parâmetro, o produto da observação resumiu-se a um parágrafo, sem fulgor, cavado num discurso incapaz de expressar devidamente o estado de repouso do contratante. por isto, por demorar a vida do biografado e por ela pretender livrar-se do contrato, numa tarde soalheira, quando ele passeava pelo parque com uma das suas amantes, decidiu matá-lo. cismou durante algum tempo sobre o modo como concretizar tal decisão. porém quase nada se sabe sobre o que aconteceu. uma mulher incerta, suspeita-se que da sua confiança, cravou-lhe cavilhas, uma em cada uma das suas mãos. depois açoitou-o. retalhou-lhe a carne em pequenos golpes, gerando refegos que, em algumas partes, permitiram denunciar músculo ou osso. drenou-lhe o sangue. temperou-lhe a carne enxuta com calda de enxofre, para a vivificar. regou-lhe as chagas e os olhos com vinagre. e, em estado de consciência permanente e sofredor, ele padeceu o suplício durante mais de quarenta e oito horas, termo após o qual expirou, como um cão não reclamado pelo dono. apesar da aturada investigação realizada pelas autoridades competentes, nunca se soube quem o martirizou e porquê.


2004/2022 - O Marquês (danado por © sérgio faria).